* Marinês Restelatto Dotti
A definição do critério de julgamento de proposta encontra previsão na Lei nº 13.303/2016, o estatuto jurídico da empresa pública, da sociedade de economia mista e de suas subsidiárias, no âmbito da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios e, também, na Lei nº 14.133/2021, a nova lei de licitações e contratações administrativas.
O critério de julgamento visa a definir como se efetivará a escolha da melhor proposta, sendo vedado ao condutor da licitação, arbitrariamente, indicá-lo durante o procedimento licitatório. Sua ausência impossibilita a formulação das propostas pelos licitantes, não confere segurança ao agente ou comissão de contratação e ao pregoeiro para a escolha da proposta, restringe a competição e fere o princípio do julgamento objetivo.
A ausência de critério de julgamento de propostas no edital não pode corresponder a vício sanável, por ofensa aos princípios da legalidade, do julgamento objetivo e da isonomia, dando causa à nulidade do procedimento licitatório e do contrato decorrente.
Lei nº 13.303/2016
No estatuto jurídico das empresas estatais, os critérios de julgamento de proposta estão assim estabelecidos:
Art. 54. Poderão ser utilizados os seguintes critérios de julgamento:
I - menor preço;
II - maior desconto;
III - melhor combinação de técnica e preço;
IV - melhor técnica;
V - melhor conteúdo artístico;
VI - maior oferta de preço;
VII - maior retorno econômico;
VIII - melhor destinação de bens alienados.
Cumpre à empresa estatal aquilatar o preço estimado do objeto da licitação, por meio da realização de pesquisa de preços e, partir daquele (preço estimado) fixar o limite máximo para aceitação das propostas de preços.
Estabelece o art. 56, inciso IV, da Lei nº 13.303/2016, que efetuado o julgamento dos lances ou propostas, será promovida a verificação de sua efetividade, promovendo-se a desclassificação daqueles que se encontrem acima do orçamento estimado para a contratação.
Art. 56. Efetuado o julgamento dos lances ou propostas, será promovida a verificação de sua efetividade, promovendo-se a desclassificação daqueles que:
[...]
IV - se encontrem acima do orçamento estimado para a contratação de que trata o § 1º do art. 57, ressalvada a hipótese prevista no caput do art. 34 desta Lei;
Nas licitações regidas pela Lei nº 13.303/2016, o preço estimado (aquilatado a partir da pesquisa de preços praticados no mercado), fixado no edital, é o preço máximo a ser admitido (art. 56, inciso IV), devendo ser desclassificadas as propostas que permanecerem acima do valor estimado após a negociação, conforme preceitua o art. 57, caput, e § 1º da Lei. Se depois de realizada a negociação com o licitante não for obtido valor igual ou inferior ao orçamento estimado para a contratação, será revogada a licitação. Assim:
Art. 57. Confirmada a efetividade do lance ou proposta que obteve a primeira colocação na etapa de julgamento, ou que passe a ocupar essa posição em decorrência da desclassificação de outra que tenha obtido colocação superior, a empresa pública e a sociedade de economia mista deverão negociar condições mais vantajosas com quem o apresentou.
§ 1º A negociação deverá ser feita com os demais licitantes, segundo a ordem inicialmente estabelecida, quando o preço do primeiro colocado, mesmo após a negociação, permanecer acima do orçamento estimado.
§ 3º Se depois de adotada a providência referida no § 1º deste artigo não for obtido valor igual ou inferior ao orçamento estimado para a contratação, será revogada a licitação.
Confira-se, a propósito, excerto do Acórdão nº 1464/2024 - Plenário (Relator Ministro Augusto Nardes, Processo nº 037.059/2023-8), acerca do assunto:
[...] ACORDAM os Ministros do Tribunal de Contas da União, reunidos em Sessão do Plenário, ante as razões expostas pelo Relator, em:
[...]
9.4. dar ciência à Codevasf que, em conformidade com o disposto no inciso IV do art. 56 da Lei nº 13.303/2016, o preço estimado é o preço máximo a ser admitido nos certames regidos pela Lei das Estatais, devendo ser desclassificadas as propostas que permanecerem acima do valor estimado após a negociação, nos termos do art. 57, caput e §§ 1º e 2º da mesma lei.
Reitera-se, pois: nas licitações regidas pela Lei nº 13.303/2016, o preço estimado é o preço máximo a ser admitido, devendo ser desclassificadas as propostas que permanecerem acima do valor estimado após a negociação. Se mesmo após a negociação não for obtido valor igual ou inferior ao orçamento estimado para a contratação, deve ser revogada a licitação
Lei nº 14.133/2021
Dispõe o art. 25, caput, da Lei nº 14.133/2021, que o edital da licitação deverá conter o objeto da licitação e as regras relativas à convocação, ao julgamento, à habilitação, aos recursos e às penalidades da licitação, à fiscalização e à gestão do contrato, à entrega do objeto e às condições de pagamento.
Art. 25. O edital deverá conter o objeto da licitação e as regras relativas à convocação, ao julgamento, à habilitação, aos recursos e às penalidades da licitação, à fiscalização e à gestão do contrato, à entrega do objeto e às condições de pagamento.
Para que os licitantes possam oferecer as suas propostas e o condutor da licitação (agente ou comissão de contratação ou pregoeiro) analisá-las e julgá-las, cumpre ao edital estabelecer o critério de julgamento de propostas conforme previsto na Lei nº 14.133/2021, verbis:
Art. 33. O julgamento das propostas será realizado de acordo com os seguintes critérios:
I - menor preço;
II - maior desconto;
III - melhor técnica ou conteúdo artístico;
IV - técnica e preço;
V - maior lance, no caso de leilão;
VI - maior retorno econômico.
De acordo com o art. 59, inciso III, da Lei nº 14.133/2021, deverão ser desclassificadas as propostas que apresentarem preços inexequíveis ou permanecerem acima do orçamento estimado para a contratação. Confira-se:
Art. 59. Serão desclassificadas as propostas que:
[...]
III - apresentarem preços inexequíveis ou permanecerem acima do orçamento estimado para a contratação;
[...]
Art. 61. Definido o resultado do julgamento, a Administração poderá negociar condições mais vantajosas com o primeiro colocado.
§ 1º A negociação poderá ser feita com os demais licitantes, segundo a ordem de classificação inicialmente estabelecida, quando o primeiro colocado, mesmo após a negociação, for desclassificado em razão de sua proposta permanecer acima do preço máximo definido pela Administração.
Também na Lei nº 14.133/2021, como ocorre na Lei nº 13.303/2016, o preço estimado (aquilatado a partir da pesquisa de preços praticados no mercado) é o preço máximo a ser admitido, devendo ser desclassificadas as propostas que permanecerem acima do valor estimado após a negociação.
Estabelece o parágrafo único do art. 24 da Lei nº 14.133/2021, contudo, que na hipótese de licitação em que for adotado o critério de julgamento por maior desconto, o preço estimado ou o máximo aceitável constará do edital da licitação. Veja-se:
Art. 24. Desde que justificado, o orçamento estimado da contratação poderá ter caráter sigiloso, sem prejuízo da divulgação do detalhamento dos quantitativos e das demais informações necessárias para a elaboração das propostas, e, nesse caso:
I - o sigilo não prevalecerá para os órgãos de controle interno e externo;
II - (VETADO).
Parágrafo único. Na hipótese de licitação em que for adotado o critério de julgamento por maior desconto, o preço estimado ou o máximo aceitável constará do edital da licitação.
Extrai-se, pois, que a nova lei de licitações e contratações administrativas admite a fixação de preço estimado em edital de licitação, quando adotado o critério de julgamento por maior desconto. Possibilita-se, neste caso, a aceitação de propostas que resultarem superiores ao valor estimado pela administração, desde que o agente de contratação ou o pregoeiro explicitem os motivos da sua aceitação.
Cite-se, como exemplo da utilização de preço estimado em licitação, o disposto nos §§3º e 4º do art. 20 da Instrução Normativa SGD/ME nº 94/2022, que dispõe sobre o processo de contratação de soluções de Tecnologia da Informação e Comunicação - TIC pelos órgãos e entidades integrantes do Sistema de Administração dos Recursos de Tecnologia da Informação - SISP do Poder Executivo Federal:
Art. 20. A estimativa de preço da contratação deverá ser realizada pelo Integrante Técnico com o apoio do Integrante Administrativo para elaboração do orçamento detalhado, composta por preços unitários e de acordo com a Instrução Normativa SEGES/ME nº 65, de 7 de julho de 2021, e suas atualizações, que versa sobre o procedimento administrativo para a realização de pesquisa de preços para a aquisição de bens e contratação de serviços em geral.
§ 1º A estimativa de preço derivada exclusivamente de propostas de fornecedores somente deverá ser utilizada mediante justificativa, nos casos em que não for possível obter preços de contratações similares de outros entes públicos ou do Painel de Preços.
§ 2º A pesquisa de preço descrita no parágrafo anterior deverá considerar, sempre que possível, os valores praticados diretamente pelos fabricantes.
§ 3º Os preços de itens constantes nos Catálogos de Soluções de TIC com Condições Padronizadas - PMC-TIC deverão ser utilizados como preço estimado, salvo se a pesquisa de preços realizada resultar em valor inferior ao PMC-TIC.
§ 4º As estimativas de preços constantes em modelos de contratação de soluções de TIC publicados pelo Órgão Central do SISP poderão ser utilizadas como preço estimado.
*Marinês Restelatto Dotti. Advogada da União. Currículo: Plataforma Lattes: https://lattes.cnpq.br/5561970349382628